O cronista do concreto
(Delman Ferreira) O velho Solar das Acácias, onde ficava a pensão, era um labirinto de escadas alarmistas e paredes indiscretas. — Cuidado, meu filho — alertou D. Elvira, dona da pensão — aqui, as paredes têm ouvidos. Júlio apenas fitou o assoalho de tábuas, descrente. Mas a solidão do quarto dilatava cada ruído. Sem ter com quem trocar impressões, começou a desconfiar das paredes. Às vezes tinha certeza de ouvir passos, risos, soluços, vindos de um não lugar. Brigas abafadas, preces suspensas. Vidas escorrendo pelas frestas. Só o Sr. Hector parecia alheio a tudo. Sentava-se sempre no mesmo canto da varanda, com um velho caderno espiral equilibrado no joelho. Observava, anotava, voltava ao silêncio. Nunca interferia. Júlio sonhava ser escritor. Intrigava-se com aquele homem. O que tanto registrava? Por quê? Criou coragem e puxou conversa. Percebeu um leve sotaque francês. Mas a conversa nãpo fluiu com ele esperava. Hector só ouvia, pouco interagia. Certo dia, uma presença nova mud...